O texto seguinte é uma adaptação (através da simples tradução para português) de um artigo publicado no jornal castelhano ABC por D. Iñigo Moreno de Arteaga, Marquês de LAULA. Apesar do artigo comentar as críticas tecidas a acontecimentos e factos monteiros praticados por personalidades importantes do país vizinho, ele constitui também uma das mais belas apologias da Caça dos tempos modernos. Parte deste texto serviu-me de base para o encerramento do recente colóquio sobre a Gestão do Javali e do Veado em Áreas Abertas, realizado em Setembro passado, em Santarém, pelo Clube de Caçadores Alvorada-pt.com.
A CAÇA
Umas conversas inoportunas entre um Ministro da Coroa e um Juiz mediático deram origem a uma infinidade de comentários não só sobre a prática cinegética bem como sobre os diferentes locais da sua prática e ainda sobre a Caça em geral.
Alguns comentaristas, entendidos na matéria e detentores das “suas” verdades, não deixaram de fustigar um e de perseguir o outro que, nesta ocasião, não eram nem mais nem menos que caçadores.
Uma vez mais este grupo social esteve na berlinda da pior publicidade. A caça caiu assim no “diz que disse” das festas plebeias, sendo maltratada com razão ou sem ela, com ou sem conhecimento de causa. Daqui resultou que, numa sociedade que assenta na matemática como é a democrática, houvesse um milhão de espanhóis a quem se negou o mais elementar direito de respeito, os quais, não se sabe com que argumentos, foram injuriados sem que ninguém se escandalizasse.
Este caso permite-me concluir que há minorias mimadas e colectividades maioritárias que são utilizadas como arma de arremesso.
O instinto recolector que os humanos têm impresso nos seus genes é por si só a origem da Caça e de outras diferentes actividades humanas. Ao contrário do que acontece com outros instintos como o da alimentação para a sobrevivência ou o sexual para a continuação da espécie – que são cultivados e engrandecidos – o instinto predador não é reconhecido pela sociedade actual.
Se recordarmos toda a historia da arte, constatamos que a Caça foi não só fonte de inspiração nas suas primeiras manifestações, como se manteve ao longo de séculos e séculos. Exemplos disso são as grutas de Altamira com os seus bisontes cheios de vida e de realismo que ainda hoje causam a admiração de todos os que por ali passam.
Depois há todo um rosário de obras que se segue, tais como o friso de Kalah representando as caçadas de Asurbanipal, rei da Mesopotâmia, os frescos de San Baudilio de Berlanga, os desenhos de Durero ou os óleos de Cranach, Brueghel, Velásquez e Goya, que nos dão matéria para meditar e questionarmo-nos porque terá sido que estes artistas se inspiraram na caça para produzirem tão grandiosas obras. E, falando de musas não são unicamente as da pintura ou da escultura as que se inclinam para a cinegética. Na música há igualmente exemplos em número suficiente: o Outono e as Quatro Estações de Vivaldi, ou em Puccini que escreveu grande parte das suas óperas (entre elas La Bohème e Madame Butterfly) alternando a composição musical com a caça aos patos no seu pavilhão de caça situado nas margens do lago Massaciucccoli.
Por outro lado a cinegética ajudou a criar um instrumento musical, a trompa, e um tipo específico de música para o qual existe mais de uma milhar de composições conhecidas.
Na arquitectura de Moritzburg, Chambord e na Pallazina de Stupinigi em Turin, abunda igualmente o conceito de que a caça é criadora de beleza e de veneração ou seja de espiritualidade . Também poderíamos estabelecer a relação entre a caça e a literatura e para isso iríamos rebuscar a memória dos tempos com os escritos de Xenofón e de Oppiano que também escreveram sobre este tema; já na Idade Média e dos escassos textos que se conservam, basta lembrarmos o Livro da Montaria do rei Afonso e o Livro da Caça de Gaston Febo.
Também nos tempos modernos é enormíssimo o número de autores e de obras relacionadas com a Caça.
Sendo assim, como é então possível que uma actividade tão arreigada nas entranhas do Homem, praticada desde sempre e ao longo de séculos, geradora de arte e de espiritualidade provoque, hoje em dia, tanta indiferença se não desprezo por parte de tantos sectores da nossa sociedade?
Por outro lado, o mundo actual é um mundo Urbano, concentrado em cidades que se converteram em “megapólis” completamente arredado do campo e da Natureza, o qual apenas conhece superficialmente de curtas visitas de fins de semana, na procura do ócio. No horizonte do asfalto e do cimento esquecem-se facilmente as leis naturais que acabam por ser consideradas como obsoletas.
No entanto, a morte, também faz parte desta mesma sociedade moderna.
Na Natureza a Vida e a Morte estão indissoluvelmente unidas, fazem parte do futuro e existem em todos os seres.
Por vezes a Morte é Cruel, como acontece com os carnívoros que devoram as suas presas ainda vivas, porque necessitam da descarga de adrenalina que este facto lhes proporciona, ou como com a Louva-a-Deus, que mata e devora o macho imediatamente após a fecundação.
A Natureza não é dócil nem sequer amável, mas na nossa civilização de plástico, todos parecem esquecê-lo ou não querer recordá-lo. E a caça, enquanto actividade primária com morte, é condenada sem apelo nem agravo.
Curiosamente, nestas sociedades modernas, a Morte é não só compreendida como bem aceite para todos os animais inferiores como por exemplo alguns insectos e répteis. É igualmente aceite e compreendida para alguns mamíferos que se consideram repugnantes – como os ratos – e seguramente para todos os animais domésticos considerados como base da alimentação humana.
Aliás, a nossa sociedade desenvolveu um sentimento de culpa em relação ao Ambiente e responsabiliza o homem por ter desequilibrado a Natureza, generalizando a ideia de que a actividade humana é perversa, pelo que mais uma vez se critica a caça como se ela fosse a origem de todos os males.
A utopia do Homem Inocente de Rosseau mudou-se para uma Natureza primária na qual o Homem deixou de ter lugar, já para não falar no caçador que é encarado como paradigma de destruição.
Pensar desta forma é o mesmo que criticar o ganadeiro por criar animais destinados ao matadouro.
Por sua vez o caçador, porque sabe que a sua actividade implica consumo, dedica especial atenção á renovação dos efectivos. Porque retira animais específicos, porque se preocupa com o vigor e com a abundância da espécie e se converte assim, egoisticamente, num conservador da Natureza.
A experiência vivida em algumas regiões de África, bem como em muitas montanhas da América e da Ásia confirmou que as espécies venatórias se potenciaram para a caça até um nível que era difícil imaginar. As populações locais compreenderam que era muito mais interessante cuidar dos animais do que utiliza-los como alimento e em consequência aumentou largamente o seu número e restabeleceu-se o equilíbrio ecológico. Foi devido à caça que se instalou a preocupação com o desenvolvimento e a vitalidade da fauna silvestre.
Ao contrário do que aconteceu nas regiões onde se fechou ou interditou a caça.
Em zonas densamente povoadas como acontece em toda a Europa, foram novamente os caçadores que possibilitaram a convivência entre os animais bravios e o Homem, fosse através do fornecimento de alimento nos períodos de crise, fosse protegendo ou coutando terrenos, fosse ainda regulando a sua densidade.
Em Espanha a Caça merece todo o respeito por se tratar de uma actividade que ocupa directamente 100 000 pessoas, cujos coutos ocupam cerca de 80% do território do país e gera uma economia cifrada em cerca de 5 000 milhões de euros, a qual incide especialmente em zonas deprimidas ou pobres, o que revaloriza mais ainda o seu impacto.
Os caçadores merecem igual ou maior respeito não só porque a sua condição humana o exige e por serem mais de um milhão de pessoas, mas também porque a sua acção é importante para o equilíbrio ecológico, e ainda porque o caçador do século XXI é um apaixonado da Natureza consciente de que o seu valor não se mede pelo número de peças abatidas mas sim pela forma como actua e pelo cuidado que dedica aos seus comportamentos.
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